domingo, 18 de agosto de 2024

2024 Peugeot 208 Style "Turbo 200" 1.0 CVT; sabores do primeiro, desgostos do terceiro

Prestes a mudar, o compacto da Peugeot agrada pelo visual e o desempenho, mas peca no espaço interno e na segurança a bordo.

Texto e fotos por Yuri Ravitz
Modelo cedido por Stellantis Brasil

Nosso exemplar testado veio na cor Cinza Artense, disponível por R$1.950 à parte.

Ele está muito perto de receber seu primeiro facelift para o mercado brasileiro, mas ainda desperta bastante curiosidade sobre suas qualidades e defeitos no uso diário, portanto, nada mais justo do que uma avaliação completa para tirar a prova real. Estamos falando do Peugeot 208, modelo mais barato da montadora em solo brasileiro que está nas bocas de passar por grandes atualizações em seu portfólio.

A fim de conferir onde o compacto francês acerta em cheio e onde precisa melhorar, a Stellantis nos cedeu um exemplar da versão Style com motor turbo, 2ª configuração mais cara da gama atual, tabelada em R$111.490, apenas 5 mil reais a menos do que a top de linha Griffe. Rodamos por uma semana e mais de 1.200km em todas as condições possíveis de rodagem.

Versão Style aposta em um visual ligeiramente mais "esportivo" do que as demais.

Antes tarde do que nunca

A segunda geração do 208 chegou ao Brasil no segundo semestre de 2020, pouco mais de um ano após sua estreia global. Trouxe um visual totalmente repaginado, além da nova plataforma CMP e mais tecnologia embarcada, porém, contava apenas com o veterano motor 1.6 aspirado flex de até 120cv e 15,7kgfm, o que causou bastante frustração nos que esperavam um motor turbinado ou, pelo menos, a manutenção do eficiente 1.2 PureTech que equipou a geração anterior por pouquíssimo tempo, descartado pelo custo.

Dois anos depois do lançamento, a Peugeot ampliou a gama com a introdução do motor 1.0 Firefly, aspirado de três cilindros, compartilhado com os Fiat Argo e Cronos, além do Citroën C3. Por fim, no segundo semestre do ano passado, veio o aguardado 1.0 turbo que estreou no Fiat Pulse, conhecido como Turbo 200 dentro da Stellantis, aliado ao mesmo câmbio CVT que equipa os irmãos de grupo, para substituir o antigo 1.6 que se despede em definitivo por não atender ao Proconve L8 que começa em 2025.

Motor 1.0 turbo coube justo no cofre do 208.

Marrento!

Para quem ainda não conhece o Turbo 200, trata-se de um motor 1.0 de três cilindros e injeção direta, totalmente flex, capaz de gerar até 130cv e 20,4kgfm quando abastecido com etanol, aliado a uma caixa automática do tipo CVT que oferece sete marchas simuladas. A outra opção mecânica do hatch francês, disponível apenas nas versões mais baratas, continua sendo o 1.0 aspirado de até 75cv e 10,7kgfm com câmbio manual de cinco marchas.

Graças ao conjunto turbinado, o 208 passou a ser o compacto mais potente, "torcudo" e rápido dentre os 1.0 turbo, indo de 0 a 100km/h em 9 segundos exatos e atingindo até 206km/h de velocidade máxima. O consumo, entretanto, não é dos melhores: nossa média geral ficou em 11,1km/l com etanol e quatro pessoas viajando. Conseguimos até 14km/l em condução mais calma e apenas o motorista a bordo, contudo, ser econômico não é a inclinação dele.

Volante, coifa do câmbio e apoios de braço nas portas dianteiras são revestidos em couro.

Quase no topo

A versão Style existe com as duas opções mecânicas, entretanto, o motor turbo também vem acompanhado de mais equipamentos de série. A lista de recursos contempla: painel de instrumentos 100% digital em 3D, câmera de ré, faróis Full LED adaptativos, central multimídia com espelhamento sem fio para smartphones, ar condicionado digital automático, sensores traseiros de estacionamento, quatro airbags, teto panorâmico, rodas aro 17 diamantadas, piloto automático, chave presencial com partida por botão, carregador de smartphones por indução, entre outros.

Nossa unidade testada trouxe acessórios como projetores de logotipo nas portas dianteiras, kit "aeroparts" com saias inferiores em preto, soleiras em alumínio e descanso de pé em inox. Comparado ao Griffe, o Style turbinado perde os airbags de cortina (que totaliza seis bolsas), sensores crepuscular e de chuva, bem como os recursos do Peugeot Driver Assist que englobam: farol alto automático, frenagem autônoma de emergência, assistente de permanência em faixa, detector de fadiga do motorista e reconhecimento de placas de velocidade.

Bancos mesclam pequenas porções de couro e alcantara.

Qualidades para poucos

Foram mais de 1.200km ao volante do 208 turbinado e, logo de cara, o francês se mostrou muito melhor do que os irmãos da Fiat equipados com o mesmo conjunto mecânico. A resposta do pedal do acelerador é excelente e a transmissão não faz o motor "gritar" quando você pisa mais forte; a rotação sobe na medida certa e já é possível fazer o que for necessário, seja uma ultrapassagem ou algum aclive mais acentuado. Ainda há o recurso das marchas simuladas que podem ser trocadas na alavanca, porém, sentimos falta dos paddle-shifters no volante que cairiam como uma luva na pegada "esportiva" da versão Style.

O acerto da suspensão privilegia o comportamento dinâmico, reforçado pelas rodas de 17 polegadas que são exclusivas dele na gama, calçadas em pneus 205/45 R17, mais largos e bem mais baixos do que os 195/55 das outras variantes equipadas com aros 16. Posto isso, o 208 Style turbinado se mostra bom de curva e bastante seguro quando mais exigido, porém, acaba por sacrificar o conforto no asfalto um pouco mais acidentado, além do consumo que também é afetado. Em contrapartida, o visual também é favorecido pelos aros maiores e diamantados, deixando o 208 brasileiro mais próximo do europeu.

Colunas e teto trazem revestimento escurecido.

O grande ponto fraco do 208, contudo, é o espaço interno. O problema não chega a ser o entre-eixos de 2,53m, semelhante ao de um Argo, mas sim a concepção da cabine por conta da arquitetura CMP e o porte do carro em si. Colocamos pessoas de diferentes estaturas e pesos para andar no hatch francês e as queixas sobre as acomodações foram unânimes. Com os bancos da frente ajustados para um adulto de 1,80m, por exemplo, apenas crianças conseguem se acomodar com algum conforto nos bancos de trás. Para levar quatro adultos de altura razoável, fatalmente alguém passará incômodo e se queixará no meio do percurso.

Os vãos das portas são altos e exigem que as pernas sejam bem levantadas para entrar e sair. Também tivemos reclamações sobre o encosto de cabeça ser muito avançado, dificultando o relaxamento da cabeça em viagens mais longas. Tirando esses apontamentos, o posto do condutor é muito bom: o banco traz ajuste de altura e boa ergonomia, apoio de braço dedicado e o volante diminuto é excelente, contando com ajustes de altura e profundidade. Uma boa surpresa foi o teto panorâmico que torna os passeios mais interessantes e, mesmo com cortina, não deixa que as cabeças dos passageiros raspem no topo da cabine.

Dianteira com as "presas de felino" se tornou marca registrada da Peugeot.

Avaliação geral

Design: o 208 se destaca frente os demais hatches do mercado nacional com uma identidade ousada e única. A dianteira é um espetáculo à parte e, de lado, as rodas aro 17 realçam o visual junto das saias do kit aero. É uma pena que a traseira, apesar de incorporar a identidade atual da marca, não traz a mesma ousadia da dianteira. Nota: 9

Interior: não acredite quando alguém lhe disser que o acabamento do 208 argentino/brasileiro é melhor que o dos demais hatches compactos, porque não é. Há plástico rígido por absolutamente todos os lados e, para piorar, sequer chega a ser um material de boa aparência como no finado 2008; apenas os apoios dianteiros de braço, localizados nas portas, trazem couro com costura azul e ponto final. Apesar disso, o estilo da cabine é bastante interessante e moderno, adotando algumas sacadas do irmão maior 3008 que ajudam a compensar a falta de capricho na escolha dos materiais. Os bancos com pequenas partes em couro e até alcantara são interessantes. Nota: 7

Mecânica: o motor turbo trouxe todo o fôlego que o novo 208 merecia e que era esperado desde o lançamento. Para melhorar, o câmbio CVT consegue acompanhar a eficiência do bloco GSE e faz uma dupla de alto padrão. O que destoa do conjunto é a suspensão traseira por eixo de torção e os freios traseiros a tambor, embora isso não seja nenhum pecado nesse segmento onde praticamente todos são iguais. Nota: 9

Tecnologia: painel digital de instrumentos já não é nenhuma novidade na categoria, todavia, o efeito 3D é exclusividade do francês - não há nenhuma utilidade extra na prática, porém, é bonito. Os faróis Full LED (que são excelentes nesse carro) também estão começando a se popularizar entre os compactos, mas com ajuste automático de altura é algo raríssimo; apenas o Polo GTS traz o recurso no segmento. O teto panorâmico também é único do 208 nessa faixa e, mesmo sem poder abrir como um teto solar, torna os passeios mais interessantes. Fora esses recursos, a versão Style turbinada não se destaca por nenhum elemento - na verdade, deixa a desejar por não trazer nenhum mísero equipamento do pacote Peugeot Driver Assist. Nota: 8

Conveniência: a chave presencial tem partida por botão e trava/destrava automática conforme você se aproxima ou afasta do veículo, entretanto, não há sensores ou botões nas maçanetas e não há a possibilidade de configurar essas opções pela central multimídia. Não há abertura remota de janelas e, para ter o fechamento remoto, é necessário pagar à parte como acessório. Os quebra-sóis trazem espelho sem iluminação e não há comandos físicos para o ar condicionado; é tudo operado na tela da central, algo que se mostra deveras inconveniente de vez em quando. A imagem da câmera de ré, embora traga visualização em 180 graus, é muito ruim. Nota: 5

Acomodações: os bancos dianteiros são bons e o do motorista conta com apoio de braço dedicado, além de ajuste de altura. Os bancos traseiros não são ruins, contudo, o espaço é limitadíssimo, digno de subcompacto. Os passageiros de trás contam com luz de cortesia no teto, mas não há portas USB, saídas de ar condicionado, tomada 12v, porta-revistas, absolutamente nada para eles. Nota: 5

Funcionalidades: tudo no 208 Style turbinado funcionou como deveria o tempo inteiro, sem travamentos ou bugs. Apesar disso, tiraremos dois pontos, sendo um pela baixa qualidade da câmera de ré e outro pelo carregador por indução que só serviu para aquecer o celular ao invés de carregá-lo. Nota: 8

Desempenho: mesmo sem ser um esportivo de fato, o 208 mostra que foi pensado para quem dirige por prazer e o motor turbo trouxe, literalmente, um novo fôlego; enquanto o 1.6 aspirado entrega seu máximo de torque somente a partir de absurdos 4.250rpm (ou 4.500rpm com etanol), o 1.0 turbo gera quase 5kgfm a mais e logo aos 1.750rpm independentemente do combustível. Freios e suspensão atendem quando são requisitados e, mesmo não sendo tão confortável quanto as outras variantes com rodas menores, o 208 Style turbinado quer mesmo ser um "bicho diferente". Nota: 9

Segurança: o 208 de segunda geração foi testado em 2019 pelo Euro NCAP e obteve quatro estrelas de cinco possíveis, sendo que a qualidade estrutural foi o destaque segundo o órgão. Dois anos depois, o "nosso" 208 feito na Argentina foi submetido ao Latin NCAP e saiu com duas estrelas, sendo que o ponto mais criticado foi, ironicamente, a qualidade da carroceria - o protocolo afirma que tanto a estrutura quanto a área dos pés foram consideradas instáveis. Para piorar a situação, a Peugeot reserva os airbags de cortina e os assistentes semiautônomos de segurança ao topo de linha Griffe. Isso deixa claro que a semelhança entre o 208 brasileiro e o europeu existe apenas por fora. Nota: 1

Custo X Benefício: destacando-se em pontos como desempenho e visual, o 208 é uma das melhores compras por preencher tais requisitos sem necessariamente figurar entre os mais caros do segmento. Por outro lado, esqueça-o se precisa de espaço ou se valoriza segurança a bordo. Vale lembrar que ele está muito perto de receber seu primeiro facelift e, com isso, podemos esperar melhorias importantes em vários pontos. Em contrapartida, a proximidade de uma atualização pode ser uma ótima chance de negociar descontos no modelo que ficará antiquado. Se gostou muito dele, compre-o e poderá ser feliz se fechar os olhos para os tópicos importantes que destacamos logo acima. Nota: 6

Avaliação final: 68/100

Identidade visual da Peugeot se expressa na traseira pelas lanternas interligadas por um aplique preto.

Considerações finais

Mesmo às vésperas de um facelift, o 208 de segunda geração pode agradar bastante no uso diário e a versão Style com motor turbo, dependendo de suas preferências, é a opção certa. Embora os assistentes semiautônomos de condução/segurança estejam se popularizando, a gente sabe que nem todo mundo faz questão de tê-los em seu veículo e talvez seja esse o grande motivo de a Peugeot ainda restringir a oferta desse tipo de equipamento. Por cerca de 112 mil reais, ele entrega tudo o que a grande maioria dos compradores valoriza atualmente e oferece uma experiência decente.

O visual sedutor do pequeno francês se combina a um desempenho para ninguém botar defeito e a alguns mimos raros ou inexistentes nos rivais, entretanto, ele comete deslizes que estão cada vez mais difíceis de serem perdoados; é a velha tática de baratear projetos globais para comercializá-los no Brasil a valores mais interessantes do que a média dos concorrentes. O fato é que o novo 208 oferece sabores do primeiro mundo, mas não sem alguns desgostos dignos do terceiro mundo e a grande dúvida é se a reestilização seguirá essa linha. Esperamos que não.

Emblema "Turbo 200" na traseira é a única identificação visual dos 208 turbinados.

Ficha técnica

Motor: 1.0 turbo, 3 cilindros em linha, 12 válvulas, flex
Potência: 130cv (E) / 125cv (G) a 5.750rpm
Torque: 20,4kgfm (E/G) a 1.750rpm
Transmissão: automática CVT com simulação de sete marchas
Tração: dianteira
Suspensão: independente na dianteira, eixo de torção na traseira
Freios: discos ventilados na dianteira, tambores na traseira
Pneus: 205/45 R17
Comprimento: 4,05m
Largura: 1,74m
Entre-eixos: 2,53m
Altura: 1,45m
Peso: 1.177kg
Porta-malas: 311l
Tanque: 47l

0 a 100km/h: 9 segundos
Velocidade máxima: 206km/h


Fotos (clique para ampliar):