quarta-feira, 5 de junho de 2024

Turbolag; você está entendendo (e falando) do jeito errado!

Por Yuri Ravitz

Foto: Divulgação

O mundo automotivo está na era da eletrificação, buscando substituir os motores a combustão pelos motores elétricos que, falando em termos de aproveitamento energético, são muito mais eficientes na produção de desempenho e no aproveitamento dele, por assim dizer. Acontece que, até bem pouco tempo atrás, a "regra" da vez era o downsizing que definia a tendência de apostar em blocos menores e sobrealimentados para substituir os maiores naturalmente aspirados, ganhando em desempenho e economia de combustível. Os compressores mecânicos, mais conhecidos como "superchargers", também entram na equação, mas não chegaram nem perto de se popularizar como os turbinados.

Esse movimento global fez com que a utilização de turbocompressores aumentasse de maneira astronômica, deixando de ser algo restrito ao universo das preparações e/ou dos motores a diesel para se tornar padrão na indústria de carros de passeio. Com a mudança, muitos mitos vêm à tona e é comum a interpretação equivocada de conceitos/termos que são referentes a esse recurso da mecânica. Hoje vamos falar do turbolag, um conceito que tem sido cada vez mais citado em matérias e pautas da mídia especializada, mas que ainda é erroneamente interpretado nessas abordagens, impossibilitando o entendimento correto por parte do leitor.

Gráfico simplificado do funcionamento de uma turbina. Foto: Divulgação

Do desperdício se faz o aproveitamento

Para entender o que é o tão famoso "turbolag", é preciso dar uma pincelada no funcionamento de um motor turbinado. Basicamente, todo motor a combustão puxa o ar da atmosfera, misturando esse ar dentro dele com o combustível, fazendo a queima dessa mistura e expulsando os gases resultantes dessa queima pelo escapamento; é por isso que são chamados de "naturalmente aspirados" ou apenas aspirados. Quando se acrescenta um turbocompressor, a coisa muda um pouco, pois ele aumenta a quantidade de ar que o motor está "ingerindo", comprimindo e pressurizando-o antes de entrar no bloco para enriquecer a mistura ar/combustível e aumentar o desempenho drasticamente.

Na grande maioria dos casos, o turbocompressor possui dois caracóis e cada um traz um rotor (uma espécie de hélice, para facilitar o entendimento), sendo ambos unidos por um único eixo que tem a função de garantir que os dois rotores girem na mesma velocidade. Um desses caracóis (a TURBINA) recebe os gases de escape que seriam desperdiçados, canalizando-os para girar o primeiro rotor que, consequentemente, faz o segundo rotor se movimentar na mesma velocidade; esse segundo rotor, dentro do segundo caracol (o COMPRESSOR), é responsável por comprimir e pressurizar o ar atmosférico que o motor está puxando e que vai para dentro dele.

Resumidamente, a turbina usa os gases de escape para aumentar a pressão e a quantidade do ar atmosférico que entra no motor; após essa operação, os gases de escape no primeiro caracol seguem seu caminho natural pelo escapamento até serem expulsos definitivamente, enquanto o ar que entra no segundo caracol é admitido pelo motor. Existe muita coisa no meio desse caminho que pode variar de um projeto para outro, mas o princípio básico é esse. Sendo assim, o que seria o famoso "turbolag"?

Foto: Divulgação

Atraso e impossibilidade não são sinônimos

Turbolag significa, literalmente, atraso do turbo. É o tempo que o turbocompressor demora, já dentro de sua faixa de trabalho, desde que você pisa no acelerador até ele conseguir responder e entregar todo seu impulso extra. Entenda que o turbocompressor precisa se encher de ar atmosférico para gerar pressão suficiente e jogar essa pressão extra no motor para cumprir seu papel; o problema é que ele só consegue gerar toda essa pressão a partir de uma determinada faixa de funcionamento do motor, o famoso "rpm" de rotações por minuto, afinal, ele depende do fluxo de gases de escape para mover o rotor. Quanto menos o motor gira, menor é esse fluxo, pois há menos queima de gases.

Antes dessa faixa, o turbocompressor simplesmente não consegue gerar pressão o bastante para trabalhar com força total, logo, não existe um "atraso na resposta"... pois não há resposta - se não há atraso na resposta, não há lag, portanto, não existe "turbolag". Trocando em miúdos: se o seu carro turbinado entrega o máximo de torque a partir dos 2.000rpm, por exemplo, você já sabe que o turbocompressor dele só conseguirá entregar todo seu potencial a partir dessa faixa de rotações. Abaixo dessa faixa, o turbocompressor também atua, mas sem entregar todo o impulso extra que foi projetado para fazer.

O turbolag só acontece quando, já dentro da faixa de trabalho máximo do turbocompressor, ele apresenta alguma demora na resposta desde que você acelera fundo até o carro efetivamente andar mais. Isso costuma acontecer em motores com turbocompressores grandes que, por conta do tamanho dos caracóis e da alta compressão, demoram a encher e gerar toda a pressão que o sistema foi projetado para entregar. A maioria esmagadora dos motores de hoje utiliza turbocompressores pequenos e leves que atuam com pouca pressão, ou seja, enchem rápido e por isso são capazes de entregar seu poder máximo quase que instantaneamente, reduzindo severamente ou até anulando o turbolag.

Foto: Divulgação

Abaixo dessa faixa de entrega máxima do turbocompressor, o que realmente acontece é o fenômeno do "limite de aumento", do inglês boost threshold, que compreende a exata faixa de rotações onde o motor ainda se comporta com uma certa apatia, uma vez que está abaixo do começo da atuação do turbocompressor. Voltando ao nosso exemplo teórico do carro que entrega seu máximo de torque a partir de 2.000rpm: abaixo dessa faixa de rotações, você estará dentro do limite de aumento e, portanto, mesmo que acelere fundo, a resposta do motor será amena e sem o mesmo vigor de quando ele sai desse limite - ou seja, quando as rotações começam a subir e o motor entra na faixa de entrega máxima do turbo.

Dependendo do caso, essa apatia que acontece dentro da faixa do "boost threshold" pode ser mais ou menos perceptível, o que tem feito muitos motoristas confundirem o evento e chamarem de "turbolag". O que acontece na realidade é: uma vez que você mantém a aceleração, o giro do motor sobe e, então, ele sai da faixa do limite de aumento, entrando na faixa de giro onde o turbocompressor consegue entrar com força total. Para resumir a ópera: turbolag só existe dentro da faixa de rotações onde o turbo já é capaz de atuar com força total e, ainda assim, demora a fazê-lo por qualquer motivo. Se ele está fora da faixa de entrega total, não existe lag/atraso de resposta e sim, o limite de aumento.