Texto e fotos por Yuri Ravitz
Modelo cedido por Ford Motor Company (FoMoCo)
Nossa unidade testada veio na cor Azul Metálico, disponível sem custo assim como as demais. |
Estamos caminhando para o fim do primeiro semestre de 2024 e, acredite se quiser, mas ainda tem quem afirme que a Ford saiu do Brasil... e, é claro, quem ainda acredite nisso. Não precisa perder muito tempo pesquisando para ver que tudo não passa de mero boato; a marca vem trazendo novidades com regularidade (como a nova geração do icônico Mustang que foi apresentada oficialmente há um mês) e, além disso, continua circulando normalmente com sua frota de imprensa entre jornalistas, YouTubers e influencers pelo país afora.
Outra dessas novidades é a segunda geração do Territory como o conhecemos, que não possui quaisquer ligações com o finado SUV homônimo fabricado na Austrália entre 2004 e 2016. Lançado no segundo semestre do ano passado, o novo Territory corrigiu os erros da primeira geração, lançada no meio da pandemia de COVID-19, visando reacender o interesse do público brasileiro pela marca do oval azul; está disponível em versão única Titanium, tabelada em R$209.990, e nós testamos por uma semana para conhecer seus acertos e erros.
A segunda geração do Territory manteve a plataforma do primeiro modelo, compartilhada com o chinês S330 da Yusheng, fruto da parceria entre a JMC e a Ford. Ele continua sendo fabricado na China e é comercializado com o nome de Equator Sport em alguns mercados, entretanto, essa arquitetura passou por atualizações para acomodar não só a nova carroceria, mas também as novas tecnologias presentes e o conjunto mecânico igualmente renovado.
Essencialmente, o novo Territory está mais Ford e menos JMC. Haja vista que, dessa vez, trata-se de um produto presente unicamente no portfólio da norteamericana e não um rebadge de outro carro como era seu antecessor. A carroceria, o interior e a filosofia de design são completamente novos, mais alinhados com o que a Ford tem buscado oferecer nos mercados asiáticos - que é diferente de sua estratégia para os europeus, que também difere do posicionamento para os americanos e assim por diante.
Debaixo do capô, poucas coisas à mostra. Proteções plásticas cobrem a maioria das fiações. |
...e o corpo sente
Debaixo do capô do Territory de segunda geração se esconde um motor conhecido, porém, com uma atualização importante. É o mesmo 1.5 turbo a gasolina, de injeção direta e quatro cilindros da geração anterior, mas que passou a trabalhar no tradicional ciclo Otto ao invés do Miller que foca mais em economia de combustível do que em performance. Agora, ele passa a gerar até 169cv e 25,5kgfm de potência e torque máximos contra 150cv e 22,9kgfm conseguidos no ciclo antigo - mesmo ficando 73kg mais pesado, a relação peso X potência se manteve praticamente a mesma enquanto a peso X torque melhorou, bem como a aceleração de 0 a 100km/h que caiu 1,5 segundo.
Sobre a transmissão, sai o câmbio automático CVT da geração passada e entra uma nova caixa automatizada de dupla embreagem com sete velocidades. Pode ser que "Ford" e "dupla embreagem" na mesma frase lhe causem calafrios, entretanto, trata-se de uma transmissão nova e banhada a óleo, sem quaisquer ligações com os finados Powershift que já foram abandonados pela marca há anos. Também é importante frisar que, apesar do 1.5 turbo ser chamado de Ecoboost pela marca, ele não tem relação com o "verdadeiro" 1.5 turbo da família Ecoboost que equipa, por exemplo, o Bronco Sport nos Estados Unidos.
Cluster de instrumentos faz "junção" com a tela da central multimídia na mesma moldura. |
É assim que se faz
Oferecido em versão única e sem opcionais, o Territory Titanium traz uma grande lista de itens de série que contempla: faróis Full LED por projetores com ajuste elétrico de altura, cluster de instrumentos 100% digital, ar condicionado digital de duas zonas com saídas traseiras, freio eletrônico de estacionamento com auto hold, câmeras em 360º com visão superior e em 3D, faróis de neblina em LED com função de luz de curva, sensores dianteiros e traseiros de estacionamento, teto solar panorâmico, iluminação ambiente, bancos dianteiros com ajustes elétricos e refrigeração, chave presencial com partida por botão, sensores crepuscular e de chuva, monitoramento de pontos cegos, carregador de smartphones por indução, retrovisor interno fotocrômico, entre muitos outros.
Há um bom conjunto de assistências semiautônomas de segurança que engloba: piloto automático adaptativo, assistente de permanência em faixa, farol alto automático, alerta de saída segura dos ocupantes (emite avisos sonoros caso uma porta seja aberta durante a passagem de outro veículo), monitoramento de tráfego cruzado na traseira, frenagem autônoma de emergência e assistente de estacionamento Park Assist. Por fim, há seletor de modos de condução com 4 opções, central multimídia de 12,3 polegadas com espelhamento sem fio e tampa elétrica do porta-malas com acionamento por movimento (o famoso "chutinho" embaixo do para-choque).
Rodamos mais de 450km ao longo da semana com o novo Territory e tivemos boas surpresas ao volante do SUV médio sino-americano. Para começar, o visual não é dos mais Ford que existem e sequer faz conexão com os outros produtos da marca vendidos no Brasil, porém, passa uma ótima impressão e o faz parecer estar acima dos outros médios - lembre-se que ele rivaliza com Jeep Compass, Toyota Corolla Cross e Volkswagen Taos, só para citar alguns dos rivais diretos. As linhas são mais quadradas e apelam puramente para a elegância e sobriedade, complementadas pelo ar tecnológico do conjunto ótico que é totalmente composto por LEDs. Há detalhes cromados por todos os lados e as rodas aro 19 seguem o padrão diamantado com a parte interna em cinza; na traseira, as setas indicadoras de direção têm funcionamendo dinâmico, "correndo" de dentro para fora como em modelos premium, dando um toque a mais de sofisticação.
Para abrir o carro, você pode configurar o sistema para identificar a chave próxima e destravar/travar as portas sozinho (como nos Renault) ou deixar a operação apenas pelos botões nas maçanetas da frente. Por dentro, a cabine impressiona pelo padrão de acabamento e espaço interno, sendo mais espaçosa que a do Compass e infinitamente maior que a do Corolla Cross - quem mais se aproxima do Territory nesse tópico é o Taos. Quatro adultos viajam com sobra de espaço tanto para a cabeça quanto para as pernas, além de uma cadeira infantil no centro do banco traseiro (que é bipartido) ou até mesmo um quinto adulto. Toda a porção superior do painel e das quatro portas é do tipo soft touch, mas o revestimento mesclando cinza escuro e azul petróleo, embora tenhamos gostado e fuja do lugar comum, pode não agradar a todos.
Novo Territory esbanja espaço interno para todos. |
Ao se acomodar no banco do motorista, você não tem dúvidas de que está em um carro médio - poderia se passar por um sedan se não fosse a posição elevada de dirigir que, por sinal, permanece assim mesmo na posição mais baixa do assento. O ambiente é bem amplo e não é difícil encontrar a melhor postura para conduzir, mas é uma pena que o volante cubra parte das informações do painel de instrumentos quando está ajustado mais para baixo. A partida se dá por um botão "escondido" atrás do lado direito da direção e é acompanhada da tradicional varredura do cluster de instrumentos que, vale lembrar, possui dois layous diferentes, sendo um mais tradicional com marcadores circulares e outro mais moderno com mostradores digitais e analógicos dispostos na vertical.
O isolamento acústico é ótimo para os ruídos do motor e pneus, entretanto, não isola os barulhos da rua com tanta eficiência; tem vezes que chega a parecer que alguma janela ficou entreaberta e você aciona o comando dos vidros para se certificar de que está tudo bem fechado. Quando em movimento, o novo Territory é sublime e absolutamente suave como se espera de modelos médios, mostrando o bom trabalho da engenharia brasileira da Ford no acerto dinâmico, especialmente na suspensão - mesmo com rodas aro 19 em pneus de perfil 50, as batidas secas não acontecem e o conjunto não mostra ter chegado ao fim de curso, mantendo uma estabilidade dinâmica considerável em trechos sinuosos para um veículo desse porte. É como se combinasse as "personalidades" do Compass e do Taos.
Painel de instrumentos no layout clássico, sempre combinando mostradores digitais e em estilo analógico. |
O 1.5 turbo entrega seu máximo de torque a partir dos 1.500rpm, porém, apresenta muita suavidade o tempo inteiro; é o tipo de conjunto que não quer arrancar suspiros ou empolgar ao volante, mas mostrar rapidez e eficiência quando for necessário. De fato, em sintonia com a transmissão de dupla embreagem, o pequeno quatro-cilindros leva os pouco mais de 1.700kg do SUV com leveza e não deixa a desejar quando é exigido em ultrapassagens e ocasiões que pedem mais força - a única queixa é a absoluta falta de possibilidades de trocas manuais, seja por paddle-shifters ou qualquer outro sistema. Há ocasiões em que ele demora a reduzir marchas (kickdown) ou as segura sem a menor necessidade, atrasando a resposta e a aceleração como se estivesse no modo Eco.
De maneira geral, apesar de não faltar disposição, o desempenho é ligeiramente inferior se comparado aos rivais igualmente turbinados e o grande culpado é o peso, afinal, para fins de comparação, são 116kg a mais em relação a um Compass Série S T270 e 285kg a mais em vista de um Taos Highline, o que é muita coisa. Consumo também não está entre os pontos fortes do sino-americano: registramos uma média entre 11 a 12km/l em percurso misto, ar condicionado ligado o tempo inteiro e sem start-stop, números inferiores aos que são possíveis nos concorrentes. Pode ser que as médias subam um pouco no modo Eco, mas o alto peso aliado ao perfil pouco aerodinâmico, de todo modo, não ajudam.
Design: como dissemos anteriormente, o Territory não faz conexão visual com os outros carros da marca vendidos no Brasil, mas isso não significa que não seja interessante. Achamos o conjunto muito acertado e ele também se mostrou atraente aos passantes das ruas, porém, é na análise do design que a gente nota traços de longa data da Ford - há desalinhamentos visíveis na carroceria. Notamos descontinuidade de linhas entre as portas dianteiras/traseiras e na tampa do porta-malas, na altura das lanternas. Em um primeiro momento, isso incomoda apenas pela estética; só o tempo dirá que outros possíveis impactos esses desalinhamentos podem causar. Fora isso, a estética do SUV sino-americano é muito bonita e ele aparenta ser mais caro do que é. Nota: 7
Interior: o acabamento geral é bastante superior ao que se encontra nos rivais. Há muitas superfícies de toque suave e a Ford merece parabéns por não ter esquecido as portas traseiras - elas trazem o mesmo capricho das dianteiras com os detalhes imitando madeira, materiais soft touch, apliques cromados e até as guias de LED da iluminação ambiente. Falando em cromados, o tom escurecido deixa as peças menos escandalosas do que poderiam ser, mas o ambiente ficaria mais interessante se tivesse um pouco menos disso, o que também ajudaria na limpeza. É o que os gringos chamam de "pesadelo das digitais" (fingerprint nightmare), pois as telas e quase todos os comandos que você toca ficam marcados por seus dedos. Nota: 8
Mecânica: o 1.5 turbo entrega números e desempenho na média dos rivais, enquanto a transmissão automatizada de dupla embreagem é coisa rara na categoria - por não ter ligação com o malfadado Powershift, tudo indica que não trará dores de cabeça a longo prazo. Freios a disco nas quatro rodas e suspensão independente até na traseira o nivelam aos concorrentes mais sofisticados. Nota: 9
Tecnologia: o Territory tem tudo o que um SUV médio moderno pede e até mais um pouco. Se levarmos em conta o quanto ele custa em vista de tudo o que entrega, é praticamente imbatível nesse aspecto. Nota: 10
Conveniência: há quebra-sóis com espelho e iluminação, luzes de cortesia nos retrovisores externos, abertura e fechamento remoto de janelas e teto solar, alças de teto, apoios de braço na frente e atrás, além da possibilidade de se configurar vários parâmetros do carro para que quase tudo fique do jeito que você gosta. Ironicamente, não é possível ajustar a luminosidade da iluminação ambiente ou mesmo desligá-la - se você não gostar disso ou não quiser usar por qualquer motivo, não há como mudar. Por fim, alguns comandos deveriam ser físicos e não digitais pela tela da central multimídia - você precisa desencostar do assento e desviar a visão da pista para realizar coisas simples como mexer no ar condicionado ou trocar o modo de condução escolhido. É o "velho novo" problema de querer digitalizar demais a cabine e isso acabar mais atrapalhando do que ajudando. Nota: 6
Acomodações: há espaço de sobra para cinco ocupantes, duas portas USB para os passageiros da frente e uma para os de trás, assoalho traseiro plano, muitos porta-objetos por todos os lados e um porta-malas de razoáveis 448 litros. O enorme teto panorâmico realmente vai até a região da cabeça de quem viaja na segunda fila, deixando o ambiente mais iluminado e arejado quando está aberto - por sinal, a abertura da seção frontal do teto também é bastante ampla. Nota: 10
Funcionalidades: de vez em quando, o farol alto automático parece não detectar os carros adiante e aciona o feixe alto, ofuscando a todos - é melhor não utilizar o recurso e controlar manualmente. O mesmo aconteceu com o sistema de visão 3D das câmeras de estacionamento que, vez ou outra, não quis funcionar, mantendo apenas no 2D padrão. Fora essas ocorrências, tudo funcionou perfeitamente. Nota: 7
Desempenho: o ponto alto do novo Territory nesse quesito é o acerto primoroso da suspensão, entregando muito conforto e relativa firmeza quando necessário. Sobre a desenvoltura do conjunto motor e transmissão, nada extraordinário, mas na média do segmento. Nota: 7
Segurança: além da fartura de recursos, o novo Territory gabaritou o C-NCAP (divisão chinesa do instituto) com cinco estrelas e observações positivas. Queremos destacar os faróis que trazem projetores de lente lisa "clear" e estão entre os melhores que já vimos até hoje. Nota: 10
Custo X Benefício: falando do valor de tabela atual, temos o Territory Titanium por R$209.990, custando o mesmo ou menos do que as versões mais caras da maioria dos concorrentes. Ele entrega mais espaço interno do que todos eles, uma lista de equipamentos equivalente ou superior e acabamento melhor de maneira geral, nivelando-se em desempenho e deixando a desejar em economia de combustível. Se o último fator não estiver entre suas prioridades, é muito difícil não indicá-lo em detrimento dos rivais, a não ser que você não tenha acesso fácil a uma concessionária Ford para realizar os cuidados periódicos. O conjunto da obra ficou muito bom e, analisando somente por esse ângulo, o novo Territory tem plenas condições de fazer barulho no segmento. Se tivesse uma gama mais ampla de versões com alternativas mais em conta, talvez fizesse um "estrago". Nota: 8
Avaliação final: 82/100
Reparou na parte escura dos "olhos de gato" no para-choque? São as luzes traseiras de neblina, feitas por LEDs. |
Considerações finais
Quando a primeira geração do Territory chegou ao mercado brasileiro, o cenário dos SUVs médios era bem diferente. A concorrência era menor e o mundo econômico ainda estava começando a sentir os efeitos negativos da pandemia, porém, mesmo assim, o utilitário não emplacou. A situação que a segunda geração do modelo encontra no país é mais complicada, pois existem muitos adversários novos e com gamas de versões mais completas, preços menores, motorização híbrida, entre outros pontos. Tanto é que os índices de vendas do sino-americano ainda são bastante tímidos.
Resumindo: o novo Territory tem inúmeras qualidades e nos faz esquecer do antigo por completo, entretanto, era esse o carro que deveria ter chegado naquela época. Atualmente, por melhor que seja, não conseguimos enxergá-lo batendo de frente com os chineses, por exemplo, que trazem porte semelhante, nível de equipamentos próximo e motorização híbrida. Se você não faz questão de "eletrificar" sua garagem por hora e não tem interesse nos puramente chineses, aí sim, o Territory se posiciona como um dos melhores SUVs médios da atualidade no Brasil.
Concorrentes: Honda ZR-V, Chevrolet Equinox, Jeep Compass, Toyota Corolla Cross, Volkswagen Taos, BYD Song Plus, GWM Haval H6, Hyundai Tucson, Peugeot 3008
Motor: 1.5 turbo, 4 cilindros em linha, 16 válvulas, gasolina
Potência: 169cv a 5.500rpm
Torque: 25,5kgfm a 1.500rpm
Transmissão: automatizada de dupla embreagem com sete marchas
Tração: dianteira
Suspensão: independente nas quatro rodas
Freios: discos ventilados na dianteira, discos sólidos na traseira
Pneus: 235/50 R19
Comprimento: 4,63m
Largura: 1,93m
Entre-eixos: 2,72m
Altura: 1,70m
Entre-eixos: 2,72m
Altura: 1,70m
Peso: 1.705kg
Porta-malas: 448l
Tanque: 60l
Porta-malas: 448l
Tanque: 60l
0 a 100km/h: 10,4 segundos
Velocidade máxima: 180km/h
Fotos (clique para ampliar):